Paralisia obstétrica

Generalidades

 

A paralisia obstétrica (po) é definida como uma paralisia flácida (parcial ou total) do MMSS, secundário a uma lesão do plexo braquial, causada pelas manobras do parto. A incidência e gravidade vem diminuindo ao longo tempo, devido ao aperfeiçoamento dos cuidados obstétricos.

 

Etiologia

 

=> O trauma ocorre por estiramento forçado de um ou mais componentes do plexo braquial por tração :
– apresentação pélvica: a cabeça é extraída por forte flexão lateral no tronco e no pescoço, lesando o plexo
– apresentação em vértice: os ombros são liberados através da flexão lateral forçada da cabeça e pescoço
– fórceps: pode contundir diretamente o plexo braquial.

=> Os fatores de riscos são:
– alto peso ao nascer (1kg a mais que a média)
– trabalho de parto prolongado
– apresentação pélvica
– distocia de ombro

=> Estudos comprovaram que a maioria das rupturas ocorrem no plexo inferior (mais frágil que o plexo superior) e ao nível do forame ou dentro do sulco do processo transverso. A avulsão das raízes nervosas ao nível da medula frequentemente cursa com lesão do neurônio motor superior

 

Classificação

 

=> Gravidade da Lesão:
– Lesões Leves: estiramento de fibras nervosas + edema perineural + hemorragia . Ocorre uma recuperação completa com a absorção do edema.
– Lesões Moderadas: estiramento + arrancamento + hemorragia intra e extra neural. A recuperação na maioria das vezes é lenta e incompleta devido a lesão por arrancamento .
– Lesões Graves: ruptura completa dos troncos do plexo ou uma avulsão real das raízes da medula espinhal. Neste tipo a recuperação é muito ruim.

=> Nível da Lesão:
– Paralisia de Erb-Duchenne (paralisia do braço superior – 75%): acometimento da Quinta e Sexta raízes nervosas cervicais e suas derivações.
– Paralisia de Klumpke (paralisia do braço inferior – raro): acometimento ao nível da oitava raiz cervical e primeira raiz torácica.
– Paralisia Total do Braço (24%): existe algum tipo de envolvimento em todos os componentes do plexo.

 

Classificação de Narakas

narakas classification of obstetric palsy
  • Grupo I: paralisia alta ou de Erb, sendo o nível da lesão nas raízes C5-C6, estando a abdução do ombro, rotação externa e flexão do cotovelo comprometidas, o prognóstico é bom e a recuperação espontânea em torno de 80%.
  • Grupo II: paralisia de Erb estendida, além do grupo muscular envolvido no grupo I observa-se a extensão do punho paralisada, sendo o nível lesional nas raízes C5, C6 e C7. Recuperação espontânea em torno de 60% dos casos.
  • Grupo III: paralisia total do membro superior, “flail arm”, e o nível lesional em todas as raízes do plexo, C5, C6, C7, C8, T1. Recuperação espontânea do ombro e cotovelo em 30 a 50% dos casos. A função da mão pode ser recuperada em muitos pacientes.
  • Grupo IV: paralisia total do membro superior com síndrome de Horner. O pior prognóstico sem cirurgia.

Recomenda-se que a classificação seja aplicada cerca de duas semanas após o parto, tempo no qual as lesões devidas à simples bloqueio de condução começam a recuperar.

Quadro clínico

 

=> Imediatamente após o nascimento o membro afetado fica sem movimento ao lado do tronco com o cotovelo em extensão. É necessário ressaltar sobre 02 reflexos que caracterizarão os tipos de paralisia:

A) Reflexo de Moro consiste em: manter o pcte em decúbito dorsal + abdução e extensão dos MMII E MMSS. Após isto, estimula-se o paciente com a extensão do pescoço (existem várias maneiras e uma delas é elevar o bebê acima da mesa segurando suas mãos, em seguida libera-as rapidamente) e o reflexo será abdução e extensão dos MMII e MMSS + extensão dos dedos (em leque) + flexão das falanges distais do 1º e 2º quirodáctilos. Em seguida ocorre flexão e adução do MMSS semelhante a um abraço.

B) Reflexo de preensão: corresponde a um dedo ou lápis colocado pela bordo ulnar da palma da mão estimulando o tono flexor e os dedos agarrarão o objeto; se tentar puxar, ela aumentará o tônus da flexão dos dedos podendo ser suspenso c/ o objeto que está segurando.

=> Klumpke: ocorre comprometimento dos flexores longos dos dedos e músculos intrínsecos da mão c/ presença do reflexo de Moro e perda do reflexo de preensão. A presença da síndrome de Horner ipsilateral (miose , ptose e enoftalmia) e / ou paralisia dos músculos paraescapulares indica presença de lesão das raízes antes de formar os troncos do plexo braquial.

=> Erb-Duchene: comprometimento dos músculos deltóide, manguito rotador, bíceps, supinador e braquiorradial mantendo o braço em rotação interna e pronação. Os dedos e punhos possuem uma mobilidade ativa normal . Ausência do reflexo de Moro, porém presença do reflexo de preensão.

=> Paralisia Total: não há tônus muscular, sem sensibilidade, c/ reflexo de preensão ausente.

=> Outra característica importante é a presença de deformidades residuais nas articulações:

A) Ombro: as deformidades são classificadas de acordo com Zancolli em grupos e subgrupos:

– Grupo I (90%): contratura em rotação medial – adução s/ subluxação (A) ou c/ subluxação posterior (B); contratura em rotação lateral-abdução c/ subluxação ou luxação antero-inferior (C); contratura de abdução pura (D).

A contratura em rotação medial e abdução é a mais comun e ocorre devido a paralisia dos músculos do manguito rotador (posterior), deltóide posterior e médio, associado a contratura miotática do músculo subescapular, peitoral maior, redondo maior e grande dorsal. O tipo A e B podem ser diferenciados entre si pelo sinal da elevação escapular de Putti (cotovelo fletido 90° + ombro aduzido e rodado lateralmente = se houver subluxação ou luxação posterior a borda supero-medial da clavícula se elevará). Esta posição c/ o tempo leva a displasia glenoidal (alargamento e achatamento) c/ deslocamento da cabeça umeral. Posteriormente o acrômio vira-se p/ baixo e o processo coracóide alonga-se interpondo na articulação glenoumeral.

A contratura em abdução – rotação lateral é causada pela fibrose e contratura do manguito posterior, associado a abdução do ombro para compensar a limitação da rotação lateral . O sinal de Putti é positivo (devido a contratura muscular), só que a manobra é diferente (rotação medial + adução).

A contratura de abdução pura (raro) é causada pela contratura isolada do músculo supraespinhal com sinal de Putti positivo após a adução do ombro.

– Grupo II: corresponde a paralisia flácida pura s/ contratura muscular, subluxação ou luxação. Neste caso o sinal de Putti é negativo.

B) Cotovelo: desenvolve contratura em flexão devido a ação excessiva do bíceps e braquial. Dentre as alterações ósseas associadas destaca-se a hipertrofia do olécrano e processo coronoide. A luxação posterior da cabeça radial pode ocorrer se o membro acometido for imobilizado por longo tempo em flexão (contra-resistência do tríceps leva ao encurvamento da ulna, alterando a articulação radioulnar proximal) e supinação (sofre contra-resistência do pronador redondo espástico). Estas alterações aumentam a pressão da cabeça radial contra o capítulo, levando ao crescimento ósseo anormal, culminando c/ “deformidade em baqueta de tambor” (achatamento e chanfradura anterior da epífise radial proximal) levando a luxação da cabeça radial.

C) Antebraço e Mão: deformidade em pronação (devido a paralisia dos supinadores) é a mais comum e se não corrigida pode levar também a luxação da cabeça radial. A deformidade em supinação ocorre devido a paralisia dos pronadores e o tracionamento do bíceps (que pode levar ao encurvamento do rádio ao redor da ulna, assim como a luxação anterior da cabeça). No Klumpke é que ocorre paralisia dos músculos da mão.

 

Diagnóstico deferencial

 

– fratura do úmero
– epifisiólise umeral proximal
– fratura de clavícula
osteomielite
– pioartrite

Portanto quando houver suspeita de paralisia obstétrica deve-se solicitar Rx de clavícula e MMSS .

 

Tratamento

 

A) Conservador: objetivo do tratamento é prevenir o desenvolvimento de contraturas durante a recuperação espontânea. No passado, imobilizava-se o membro em abdução (70°), flexão (10°) e rotação lateral do ombro (90°), c/ supinação do antebraço (tala em estátua da liberdade). Este método foi abandonado devido aos casos de luxação umeral e da cabeça radial, que as crianças apresentavam. Atualmente o tratamento é fisioterápico (3 a 4 vezes ao dia) com movimentação de todas as articulações do MMSS acometido em seu total arco amplitude fisiológica.

Na paralisia dos flexores do cotovelo e supinadores do antebraço em uma criança de 04 a 06 semanas pode-se usar por 03 meses uma órtese cotovelo-punho c/ flexão do cotovelo (60°) e antebraço supinado (máximo de 45°). A órtese é retirada algumas horas pela manhã e a tarde p/ a fisioterapia e completado o período é usada apenas a noite por mais 02 a 04 meses.

B) Cirúrgico: o reparo neurocirúrgico precoce só está indicado em lesões totais após 03 meses de idade, pois é o tempo necessário p/ haver recuperação espontânea. Em casos de paralisia parcial do plexo, os resultados da neurorrafia precoce não são satisfatórios. Nestes casos, recomenda-se a correção das deformidades residuais que venham existir após 03 anos de idade.

Deformidades residuais:

=> Ombro:
1) tipo IA: liberação da contratura miotática através do alongamento do subescapular e peitoral maior e aumento da força de rotação lateral do ombro através da transferência do redondo maior e grande dorsal para a diáfise umeral (Técnica de Sever-L’Episcopo modificada por Green). Recomenda-se a inserção do grande dorsal e redondo maior no manguito rotador.
2) tipo IB: osteotomia em rotação lateral do úmero. Esta técnica também pode ser indicada nos casos em que o redondo maior e grande dorsal estão paralisados mesmo s/ luxação glenoumeral.
3) tipo IC: alongamento do infraespinhal (através da interposição do redondo menor) e se houver incongruência articular realiza-se a osteotomia em rotação medial.
4) tipo ID: alongamento em Z do infraespinhal contraído.
5) tipo II: se mesmo com a paralisia flácida houver sensibilidade na mão, a flexão do cotovelo é obtida pela transferência do esternocleidomastoideo (Técnica de Bunnel) ou do peitoral maior (Técnica de Clark). Se houver perda da sensibilidade da mão é recomendável a realização de uma amputação abaixo do cotovelo para uso de uma órtese funcional.

=> Cotovelo: se a deformidade em flexão for > 40° a 50° (sem resposta ao tratamento conservador com fisioterapia + imobilização em máxima extensão) indica-se a cirurgia (ressecção do processo olecraniano hipertrofiado + alongamento do braquial e do bíceps). Se houver luxação da cabeça radial detectada precocemente realiza-se sua redução mediante o encurtamento do rádio (em sua diáfise média). Se detectada tardiamente, aguarda-se o término do crescimento e realiza a sua ressecção.

=> Antebraço: nas contraturas em pronação resistentes ao tratamento conservador (mobilização em supinação forçada + imobilização em supinação e flexão) recorre-se ao alongamento do pronador redondo com transferência do flexor ulnar do carpo para o radio distal (se a musculatura dorsoflexora estiver normal) ou para o extensor curto do carpo (se houver fraqueza na dorsoflexão do punho). Nas contraturas em supinação refratárias ao tratamento conservador realiza-se a transferência do tendão do bíceps braquial para o lado lateral do radio.

 

> Arquivos de Apresentações em ppt
> Arquivos de Resumos em pdf

 

Última modificação porMarcio R4
Quanto você gostou deste artigo?0000

2 comentários em “Paralisia obstétrica”

  1. Boa tarde. Tenho um problema no braço direito devido ao procedimento no parto, o que me deixou sem conseguir esticar o braço completamente e levantar completamente. Tenho 31 anos e estava a pensar marcar uma consulta para ver se existe alguma solução para a minha condição. Tenho entretanto algum receio de que se existir alguma solução possa haver o risco de ficar numa situação pior. Gostava de ter uma opinião acerca disto. Obrigado

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *