Impacto tibiotalar

A síndrome do impacto do tornozelo é uma condição dolorosa causada por atrito de tecidos articulares, que é tanto causa quanto consequência de uma biomecânica alterada desta articulação.

Representa uma síndrome com muitas causas que provocam dor no tornozelo secundária à interposição de osso ou de tecidos moles.

Descrito primeiramente por Morris em jogadores de futebol que apresentavam dor localizada na região anterior (frente) do tornozelo.

Sintomas

A dor é gerada quando movimentamos o tornozelo para cima (dorsiflexão), causando impacto ou impingment. McMurray criou a frase “tornozelo do jogador de futebol” , notando esta ocorrência em jogadores de futebol.

Os sintomas incluem dor nos extremos do movimento, limitação de movimentos e inchaço. A limitação dos movimentos é maior particularmente durante a extensão do tornozelo (movimento do tornozelo para cima), palpação de irregularidades ósseas .

Causas

A sua principal causa são as lesões pós-traumáticas, principalmente lesões ligamentares, resultando em dor crônica no tornozelo.

A região anterior do da tíbia forma osteófitos, que são bicos ou proeminência ósseas. Da mesma forma temos a formação de osteófitos no tálus o primeiro osso a se articular com a tíbia nos movimentos de flexão e extensão do tornozelo.

Uma das hipóteses da formação dos osteófitos seria uma flexão plantar do tornozelo forçada, causando lesão da cápsula articular anterior e formação de osso na região da lesão.

Tais formações ósseas surgem nos tornozelos de praticantes de esportes que realizam mudanças bruscas de direção.

impingment anterior do talus

Classificação

Do ponto de vista anatômico e clínico, estas síndromes de impacto tibiotalar ou no tornozelo são classificadas em: ântero-lateral, anterior, ântero-medial, póstero-medial e posterior.

Impacto ântero-lateral

É causa incomum de dor crônica lateral no tornozelo, produzida pelo aprisionamento de tecido sinovial hipertrófico na goteira ântero-lateral do tornozelo. Estima-se que aproximadamente 3% das entorses de tornozelos levem a impacto ântero-lateral.

A etiologia se deve a pequenos traumas repetidos em inversão, inicialmente sem instabilidade significativa. A continuidade dos microtraumas resulta em inflamação, hipertrofia sinovial e fibrose, causando dor e instabilidade. Nas formas mais avançadas forma-se uma lesão organizada “meniscóide”, que consiste de tecido sinovial hipertrófico e fibrose.

O ligamento talofibular anterior e o ligamento tibiofibular foram implicados como causas deste impacto. A presença de impacto ósseo anterior ou ântero-medial devido a osteófitos pode exacerbar esta condição. O fascículo acessório do ligamento talofibular anterior (ligamento de Bassett), uma variante anatômica comum, pode hipertrofiar após trauma de repetição, resultando em impacto ântero-lateral, principalmente quando outras estruturas de sustentação da região estão comprometidas.

Impacto anterior

SIAT é causa bem estabelecida e relativamente comum de dor crônica no tornozelo, podendo ocorrer em qualquer atleta sujeito a estresse em dorsiflexão de repetição, especialmente em jogadores de futebol e em bailarinas.

É bem reconhecido que as injúrias em dorsiflexão ou supinação podem causar danos às margens anteriores e mediais da cartilagem articular, e acredita-se que o reparo desta lesão com tecido de cicatrização e fibrose proliferativa leva à formação de osteófitos e avulsão da cápsula articular. Outra teoria sugere, ainda, que a dorsiflexão forçada resulta em repetidos microtraumas na tíbia e tálus, com consequentes microfraturas do trabeculado ósseo/hemorragia periosteal, estimulando a neoformação óssea. Os osteófitos tibiais e talares anteriores colidem, especialmente no movimento de dorsiflexão, provocando impacto das partes moles interpostas.

Notadamente em jogadores de futebol, no momento do chute, há um trauma direto da bola na articulação tibiotalar anterior, porque neste momento a cartilagem articular anterior está recoberta apenas pela gordura subcutânea.

Um estudo mostrou que um percentual significativo de atletas profissionais (45% a 59%) apresentava osteófitos nas radiologias convencionais, sem sintomas de impacto anterior, o que leva a crer que a associação de cicatrização e espessamento sinovial são mais importantes para produzir a síndrome clínica do que simplesmente a presença de osteófitos.

Impacto ântero-medial

É uma entidade clínica cada vez mais reconhecida na literatura ortopédica, sendo uma causa incomum de dor crônica no tornozelo.

O mecanismo exato do impacto ântero-medial ainda não está bem esclarecido, mas acredita-se que seja o resultado, inicialmente, de uma supinação forçada com componente rotacional, levando à lesão da cápsula articular ântero-medial. O impacto ântero-lateral repetido e, subsequentemente, o microtrauma produzem sinovite e espessamento da cápsula articular. Em adição, lesão óssea e da cartilagem articular pode resultar em formação de osteófitos, além de espessamento da cápsula articular e sinovial na face ântero-medial. O resultado é uma lesão meniscóide, que é representada por espessamento das partes moles anteriores aos ligamentos tibiotalares, que pode surgir isoladamente ou devido a uma lesão parcial do ligamento deltóide. Outra causa de impacto é o espessamento do ligamento tibiotalar anterior. Este espessamento ou a lesão meniscóide determinam impacto na região do canto ântero-medial durante a dorsiflexão, resultando em formações de osteófitos, lesão condral ou ambos, comumente associada a mecanismo de inversão com lesão ligamentar lateral ou medial.

Impacto póstero-medial

É causa incomum de dor após grave lesão por inversão do tornozelo, em que as fibras posteriores profundas do ligamento deltóide são comprimidas entre a parede medial do tálus e o maléolo medial. Inicialmente, os sintomas póstero-mediais não predominam quando comparados com os sintomas da ruptura do ligamento lateral. Usualmente apresentam resolução espontânea sem tratamento especifico, porém, a cura inadequada das fibras profundas do ligamento deltóide leva a inflamação crônica, fibrose hipertrófica e metaplasia.

Em muitos casos, este tecido fibrótico desorganizado pode determinar impacto entre a parede medial do tálus e a margem posterior do maléolo medial.

Impacto posterior

Esta condição refere-se a um grupo de alterações que resultam de flexão plantar forçada repetida ou aguda, também denominada de síndrome os trigonum, síndrome de compressão talar ou síndrome do bloqueio posterior do tornozelo, extensivamente descrita em atletas e dançarinos de balé clássico, bem como em jogadores profissionais de futebol.

Este tipo de impacto se desenvolve após uma significativa injúria aguda (por exemplo: avulsão do ligamento talofibular posterior, fratura do tálus ou lesão dos ossículos acessórios), no entanto, na maioria das vezes a síndrome se inicia insidiosamente em atletas predispostos. Acredita-se que a flexão forçada repetida do pé resulte em lesões crônicas ósseas e de partes moles. O mecanismo de injúria assemelha-se ao efeito de um “quebra-nozes”, em que a porção posterior do tálus e as partes moles adjacentes são comprimidas entre a tíbia e o calcâneo durante a flexão plantar dos pés.

A anatomia da região posterior do tornozelo é um fator chave no desenvolvimento deste tipo de impacto, e as causas são divididas em: ósseas e de partes moles. A mais comum é de origem óssea, representada pelos os trigonum, que são ossículos acessórios do tubérculo posterior do tálus que podem persistir não fusionados em até 7% da população geral, ou pelo processo de Stieda, que é o tubérculo lateral do tálus proeminente. Dentre as causas com origem nas partes moles estão sinovite envolvendo o tendão flexor longo do hálux, o recesso sinovial posterior da articulação tibiotalar e subtalar, e o ligamento intermaleolar posterior.

Este tipo de impacto pode se manifestar como inflamação das partes moles posteriores do tornozelo, lesão dos ossículos acessórios ou ambas. As lesões ósseas incluem fratura, fragmentação e pseudoartrose dos ossículos acessórios ou do tubérculo lateral do tálus, e as das partes moles incluem sinovite posterior e subtalar, bem como tenossinovite do tendão flexor longo do hálux.

O ligamento flexor longo do hálux tem um trajeto, profundamente, na goteira entre os tubérculos medial e lateral do tálus, e quando é envolvido no impacto posterior pode desenvolver tenossinovite estenosante.

Classificação de Scranton e McDermott

Utiliza-se os achados radiográficos para  impacto  anterior do tornozelo:

scranton e mcdermott
Classificação de Scranton e McDermott
  • grau I o impacto sinovial, com radiografias demonstrando osteófito com até 3mm;  
  • grau II apresenta exostose de reação osteocondral, com radiografias mostrando osteófito com mais de 3mm e não sendo  observado esporão talar;
  • grau III tem osteófito tibial grave, com ou sem fragmentação, e com um esporão secundário no dorso do tálus, frequentemente com fragmentação dos osteófitos;
  • grau IV mostra destruição osteoartrósica talocrural generalizada, com radiografias  sugerindo alterações osteoartrósicas degenerativas medial, lateral ou posteriormente.

Diagnóstico

As radiografias demonstram uma formação óssea achatamento do bordo anterior da tíbia e também no tálus.

Filmes realizados com o pé em dorsiflexão podem demonstrar o contato dos osteófitos anteriores da tíbia com o tálus.

Esporões tíbio-talares anteromediais podem ser de difícil visualização e, requere-se, portanto, radiografia lateral associada à radiografia convencional plana para incremento da sensibilidade (Tol & van Dijk, 2004). Além disso, o sinal de “divot”, um defeito compensatório no tálus de jogadores de futebol de alto rendimento que visa a aceitar esporões ósseos e que previne limitação da dorsiflexão de tornozelo, pode ser observado no pescoço do tálus em radiografias laterais.

A ressonância magnética é um ótimo método diagnóstico para demonstrar as alterações ósseas e as partes moles dos vários tipos de impacto do tornozelo, fornecendo dados que auxiliam não só na comprovação desse diagnóstico, como na diferenciação com outras causas de dor articular.

Tratamento

 O tratamento conservador consiste na elevação do calcanhar com limitação da dorsiflexão e uso de antinflamatórios e repouso.

A correção das técnicas de treinamento também deve ser feita, assim como a hiper-pronação dos pés, notadamente em dançarinos de ballet clássico (Hopper & Robinson, 2008).

A utilização de órteses e bandagens elásticas podem ser úteis porém apenas restringem o movimento de dorsiflexão do tornozelo

A ostectomia pode ser feita tanto por via aberta como artroscópica e é indicada quando o tratamento conservador não resolver.

Algumas lesões que provocam pinçamento envolvem partes moles incluindo o ligamento tíbio-talar, o ligamento de Bassett e as lesões meniscóides.

Última modificação porMarcio R4
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